Alvo de reclamação disciplinar no CNJ, presidente do TJBA tem 30 dias para se manifestar
Caso envolve decisões suspeitas que transferiram 366 mil hectares no Oeste da Bahia a um único homem
O presidente do Tribunal de Justiça da Bahia (TJBA), Gesivaldo Britto, terá 30 dias para se manifestar na reclamação disciplinar em que é acusado, no Conselho Nacional de Justiça (CNJ), de irregularidades na designação de juízes para atuar em comarcas no Oeste do Estado. A determinação foi feita pelo corregedor nacional de Justiça, Humberto Martins, em despacho assinado na segunda-feira, 20 de maio.
O corregedor também deu 30 dias para que as juízas Marivalda Moutinho e Eliene Oliveira, que atuaram nas comarcas de Formosa do Rio Preto e Santa Rita de Cássia por designação do presidente do TJBA, se manifestem no mesmo procedimento.
A reclamação foi motivada por uma série de atos istrativos e decisões judiciais suspeitos que transferiram a propriedade e a posse de 366 mil hectares de terra a um único homem, José Valter Dias. A área equivale a cinco vezes o tamanho da cidade de Salvador. Cerca de 300 produtores de soja que estão nas terras desde a década de 1980 estão sendo prejudicados, enquanto José Valter Dias se tornou, da noite para o dia, um dos maiores latifundiários do país.
A reclamação disciplinar contra o presidente do TJBA foi apresentada pelo deputado federal Valtenir Pereira (MDB-MT), membro da Comissão de Agricultura da Câmara dos Deputados, e pelo ex-deputado Osmar Serraglio (PP-PR), que integrou a comissão. Uma audiência pública promovida pela comissão em dezembro denunciou a existência de graves mecanismos sistêmicos de grilagem de terras no Oeste da Bahia, “havendo fortíssima suspeita de ilícitos por parte de membros da magistratura baiana”.
A reclamação aponta que o presidente do TJBA tem designado juízes para o Oeste do Estado “em afronta aos critérios legais e com o único intuito de beneficiar o casal José Valter Dias e Ildenir Gonçalves Dias”, configurando um “verdadeiro tribunal de exceção”.
“Haja vista os fatos narrados na inicial, de cunho disciplinar, manifestem-se, no prazo de 30 dias, o desembargador Gesivaldo Britto e as juízas Marivalda Almeida Moutinho e Eliene Simone Silva Oliveira, do Tribunal de Justiça do Estado da Bahia, sobre as alegações apresentadas pelos requerentes, cada qual no âmbito do que lhe é imputado”, escreveu o corregedor nacional de Justiça, Humberto Martins, no despacho.
Entenda o caso
No dia 1 de março, o CNJ anulou uma portaria de 2015 do TJBA que transferia a propriedade de 366 mil hectares a José Valter Dias e cancelava cerca de 300 matrículas (registros de imóveis) de agricultores locais.
O presidente do TJBA apresentou recurso contra a decisão, defendendo que as terras permanecessem com José Valter Dias. O CNJ rejeitou o recurso. Logo em seguida, Gesivaldo Britto nomeou a juíza Eliene Oliveira – que até então atuava em juizados especiais em Salvador, a 1.000 km de distância – para atuar em caráter excepcional, a partir de 27 de março, em Formosa do Rio Preto.
Duas semanas depois, a mesma juíza deu uma liminar contrariando a decisão do CNJ e transferindo novamente a propriedade dos 366 mil hectares a José Valter Dias. A decisão foi tomada sem ouvir os agricultores, o Ministério Público ou o ICMBio – que é parte interessada uma vez que as terras requeridas por Dias envolvem uma parcela importante de uma reserva ambiental, a Estação Ecológica Serra Geral do Tocantins.
A liminar foi suspensa pela desembargadora do TJBA lona Márcia Reis.
A juíza Marivalda Moutinho, por sua vez, emitiu uma sentença em dezembro de 2018 dando a posse de toda a área a José Valter Dias. A decisão foi tomada sem que as outras partes interessadas sequer fossem ouvidas. Para completar, ela ainda aplicou muita de R$ 1 milhão a uma parte que alegou sua suspeição para julgar o caso.